Hinos do Círio

esde a Idade Clássica, a música é um componente indispensável do culto, estando presente em quase todas as manifestações religiosas. Uma das características do Círio de Nossa Senhora de Nazaré é dada exatamente pelo caráter festivo e alegre da grande romaria, demarcado pelo ritmo das músicas e das bandas que se distribuem ao longo dela, como observou o antropólogo Isidoro Alves, apropriando-se do conceito “carnaval devoto”, criado pelo escritor paraense Dalcídio Jurandir.

É bastante comum o emprego de termos carregados de ambiguidades para definir este caráter festivo da maior romaria religiosa brasileira. “Sagrado e profano” e “carnaval devoto” são expressões que têm a força de sintetizar a convivência entre a ordem e hierarquia sacralizada pela Igreja e a informalidade festiva que romeiros e promesseiros emprestam ao Círio. Os hinos religiosos, entoados durante as 12 romarias que compõe o Círio, são elementos que permeiam os dois lados dessa equação de significados contrastantes, porém complementares.

Coube a um poeta maranhense escrever os versos que se transformaram, ao longo do tempo, no principal hino em louvor à Nossa Senhora de Nazaré. Por ocasião do lançamento da pedra fundamental da nova Igreja de Nazaré, em 1909, Euclides Farias compôs os versos de “Vós Sois o Lírio mimoso”, que acabou por se tornar o canto oficial da Santa e o mais popular hino do Círio de Nazaré. Poeta e jornalista, Euclides Farias, nasceu em São Luís, em 1837, mas foi em Belém que sua carreira de jornalista alcançou destaque. Além de poeta, foi comediógrafo, caricaturista e crítico teatral. O poema em oito versos, porém, não fazia citação direta à Santa. Somente na década de 1960 é que foi incluindo o estribilho que corrigiu a ausência, de autoria de Aldebaro Klautau, advogado e político paraense: Ó virgem mãe amorosa / fonte de amor e de fé / dai-nos a bênção bondosa / Senhora de Nazaré.

O Círio é uma polifonia de muitos cantos. Em 1975, um jovem padre mineiro e cantor em início de carreira, José Fernandes de Oliveira, mais conhecido por Padre Zezinho, apresentou, no ginásio do Clube do Remo, uma canção ainda não gravada em disco. “Maria de Nazaré” caiu nas graças dos romeiros, sendo adotada na romaria do ano seguinte. É, hoje, um dos hinos mais populares e identificados com o Círio de Nazaré.